Depois de uma passagem pelo curso de engenharia mecânica e de ter concluído uma graduação de tecnóloga em mecatrônica industrial, Heloise Fazzolari queria continuar estudando, mas não sabia exatamente por onde seguir.
O ano era 2005, e a UFABC (Universidade Federal do ABC) surgia com uma proposta diferente: o bacharelado interdisciplinar (BI). "Fiquei apaixonada pela ideia, prestei vestibular e, em 2006, comecei na primeira turma de ciência e tecnologia da UFABC", conta.
Concluídos os três anos de bacharelado interdisciplinar, Heloise se especializou em engenharia de instrumentação, automação e robótica, fez mestrado e doutorado e hoje é professora na UFABC.
"Nesse modelo de graduação, há muita liberdade para selecionar o que estudar. Isso entusiasma, mas também pode ser assustador para quem chega do ensino médio", comenta. "Fazer escolhas e arcar com as consequências, aprendendo com aquelas menos adequadas, ajuda a formar profissionais mais maduros, proativos e preparados para os desafios do mercado", acrescenta.
Como mostra a história de Heloise, o bacharelado interdisciplinar não se encaixa na lógica tradicional da formação superior, em que primeiro se define uma carreira —o velho "o que você quer ser quando crescer"— e depois onde se deseja estudar.
O BI é um curso de graduação de curta duração, entre três e quatro anos, que oferece uma formação ampla e generalista. Para isso, tem uma abordagem multidisciplinar e com um grau significativo de flexibilidade e autonomia na escolha do percurso acadêmico e da grade de matérias. Somente num segundo momento pode acontecer, ou não, o foco em uma profissão específica.
Uma das demandas de mercado que vem impulsionando os cursos desse tipo é a necessidade de formar profissionais capazes de transitar entre diferentes disciplinas do conhecimento, pensar fora da caixa e inovar.
"Os problemas do mundo são cada vez mais complexos, e encontrar soluções para eles exige pessoas com uma visão ampla e qualificadas para dialogar com uma grande diversidade de áreas", afirma o professor Valdomiro Plácido dos Santos, coordenador do BI de ciência de dados e inteligência artificial na PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas).
O curso tem duração de quatro anos, com formação principalmente em computação, matemática estatística e análise e solução de problemas, que podem estar em setores como gestão pública e saúde. Segundo Santos, a maioria dos alunos costuma entrar no mercado antes mesmo de se formar, mas alguns fazem especialização ou pós-graduação.
Outra vantagem apontada pelos que defendem o modelo é gerar profissionais adaptáveis ao mercado de trabalho em constante mudança e, portanto, às novas carreiras que surgem atualmente em número maior e mais rapidamente do que no passado.
Gabriela Chiuffa é um exemplo. Ela entrou no BI de ciência e tecnologia em 2010 sem uma decisão clara sobre qual carreira seguir. Logo ficou encantada pela multidisciplinaridade oferecida e pelas possibilidades de especialização ao final da graduação.
"Acabei cursando os bacharelados em neurociência e em engenharia biomédica. Hoje sou cientista de dados no Hospital Albert Einstein e professora de engenharia biomédica, também no Einstein", conta ela.
O BI é baseado em um modelo de três ciclos, com variações de acordo com a instituição. No primeiro, os estudantes têm contato com disciplinas de diversas áreas, mas também com um "itinerário formativo" dentro de sua área de interesse.
Com essa graduação, é possível atuar tanto em empresas privadas como no setor público e organizações não governamentais, por exemplo, em projetos que envolvam conhecimentos transversais (de diferentes áreas).
A segunda etapa pode ser a formação profissional em graduações específicas, já tendo explorado várias possibilidades acadêmicas durante o BI e com uma base sólida, muitas vezes comum a mais de uma carreira. A pós-graduação, por sua vez, é uma possibilidade tanto nesse momento como em um terceiro ciclo.
"A opção pela especialização ou pela pós-graduação costuma ser mais amadurecida do que a escolha de carreira ao final do ensino médio, afirma Fernanda Cardoso, pró-reitora de graduação da UFABC.
"É fruto de uma experiência universitária e do contato com diferentes caminhos", diz. "O bacharelado interdisciplinar também ajuda a combater a evasão, porque permite a correção de rota durante a própria faculdade. Não é preciso abandonar e começar tudo de novo", explica.
Por exemplo, um aluno que se forma em ciência e tecnologia, em três anos, ganha um diploma de graduação e pode ir ao mercado. Só que o modelo prevê também a possibilidade de fazer uma pós-graduação ou uma especialização, com opções tão diversas como biotecnologia, ciência da computação e engenharia, geralmente com mais um ou dois anos de estudo.
Quem faz o bacharelado interdisciplinar em saúde, por sua vez, pode seguir depois para enfermagem, nutrição ou mesmo odontologia, entre outras. Para esse segundo ciclo em geral há processos seletivos internos, que variam conforme a instituição. Também é possível buscar a especialização em outra faculdade.
Há 27 opções diferentes de bacharelados interdisciplinares, oferecidos por 37 instituições, a maioria universidades federais. Os cursos mais comuns são os de ciência e tecnologia, ciências humanas e ciências naturais, mas há outros, como saúde e ciências agrárias. Veja abaixo:
Cursos presenciais
Escola Dieese de Ciências do Trabalho
Interdisciplinar em ciências do trabalho
Cidade São Paulo
Fundação Universidade Federal do ABC (UFABC)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidades Santo André e São Bernardo do Campo (SP)
Interdisciplinar em ciências e humanidades
Cidade São Bernardo do Campo (SP)
Fundação Universidade Federal do Pampa (Unipampa)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade Itaqui (RS)
Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas)
Ciência de dados e inteligência artificial
Cidade Campinas (SP)
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)
Interdisciplinar em ciências e humanidades
Interdisciplinar em saúde
Cidade Curitiba (PR)
Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab)
Humanidades
Cidade Redenção (CE)
Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos)
Interdisciplinar em humanidades, artes e tecnologia
Cidade Porto Alegre e São Leopoldo (RS)
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Interdisciplinar em artes
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Interdisciplinar em humanidades
Interdisciplinar em saúde
Cidade Salvador (BA)
Interdisciplinar em ciência, tecnologia e inovação
Cidade Camaçari (BA)
Universidade Federal de Alfenas (Unifal)
Interdisciplinar em ciência e economia
Cidade Varginha (MG)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade Poços de Caldas (MG)
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
Interdisciplinar em ciências humanas
Cidade Juiz de Fora (MG)
Universidade Federal de Lavras (UFLA)
Interdisciplinar em inovação, ciência e tecnologia
Cidade São Sebastião do Paraíso (MG)
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade Recife e Caruaru (PE)
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Ciência e tecnologia
Cidade Joinville (SC)
Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ)
Interdisciplinar em biossistemas
Cidade Sete Lagoas (MG)
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade São José dos Campos (SP)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia do mar
Cidade Santos (SP)
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade São Luís e Balsas (MA)
Universidade Federal do Oeste da Bahia (Ufob)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Interdisciplinar em humanidades
Cidade Barreiras (BA)
Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Interdisciplinar em ciências agrárias
Interdisciplinar em ciências ambientais
Interdisciplinar em ciências da terra
Interdisciplinar em ciências e tecnologia das águas
Interdisciplinar em saúde
Cidade Santarém (PA)
Universidade Federal do Pará (UFPA)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade Ananindeua (PA)
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)
Interdisciplinar em ciências ambientais
Cidade Cruz das Almas (BA)
Interdisciplinar em cultura, linguagens e tecnologias aplicadas
Cidade Santo Amaro (BA)
Interdisciplinar em energia e sustentabilidade
Cidade Feira de Santana (BA)
Interdisciplinar em saúde
Cidade Santo Antônio de Jesus (BA)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Interdisciplinar em humanidades
Cidade Natal (RN)
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidade Tramandaí (RS)
Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB)
Interdisciplinar em artes
Interdisciplinar em ciências
Interdisciplinar em humanidades
Interdisciplinar em saúde
Cidades Itabuna, Porto Seguro e Teixeira de Freitas (BA)
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)
Ciência e tecnologia
Cidades Diamantina, Teófilo Otoni e Janaúba (MG)
Ciências humanas
Cidade Diamantina (MG)
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Cidades Mossoró, Angicos, Caraúbas e Pau dos Ferros (RN)
Interdisciplinar em tecnologia da informação
Cidade Pau dos Ferros (RN)
Cursos a distância
Centro Universitário Braz Cubas
Interdisciplinar em humanidades
Centro Universitário Internacional
Interdisciplinar em saúde
Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc)
Interdisciplinar em ciência e tecnologia
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)
Interdisciplinar em negócios
Universidade Cidade de São Paulo
Interdisciplinar em humanidades
Universidade Cruzeiro do Sul
Interdisciplinar em humanidades
Universidade de Franca
Interdisciplinar em humanidades
Fonte: Cadastro Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior (Cadastro e-MEC)
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