Sem verbas nem para as lâmpadas, estaduais do Rio perdem estudantes

Adriano Vizoni/Folhapress
RIO DE JANEIRO - RJ - BRASIL, 18-08-2017, 16h00: ESPECIAL RUF 2017. Campus da UERJ, no bairro do Maracana. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, ESPECIAIS) ***EXCLUSIVO FSP***
Campus da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), no bairro do Maracanã, no Rio
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Umas das melhores universidades do país, a Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) não tem recursos para substituir as lâmpadas que queimam. Nos corredores escuros, há lixo acumulado. O ano letivo mal começou.

A crise financeira da Uerj, no entanto, ainda não aparece em avaliações como o RUF.

Classificada em 14º lugar dentre as 195 universidades do país, a instituição se mantém bem colocada porque os dados de hoje refletem as atividades dos últimos anos.

É como um navio em cruzeiro que, mesmo sem novo combustível, segue em movimento por inércia.

"Quando uma universidade está atravessando algum problema, não há uma queda rápida nas avaliações. Mas se continuar sendo tratada com o descaso pelo governo estadual, vai cair", diz o reitor Ruy Garcia Marques.

O "descaso" pode ser traduzido pela inconstância no repasse às duas universidades estaduais do Rio, a Uerj e a Uenf (Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 58º no RUF).

Os professores e funcionários dessas duas escolas chegaram a ficar três meses sem salário neste ano. O governo quitou as contas até julho. Ainda falta pagar o 13º salário de 2016 para quem ganha mais de R$ 3.200 mensais.

"Estou com dívidas em todos os cartões de créditos por causa dos atrasos", diz o engenheiro químico da Uerj Evandro Brum Pereira. Ele virou um símbolo da crise das estaduais do Rio ao postar nas redes sociais, em junho, uma foto pedindo trabalho.

"Os professores e funcionários estão desanimados, há casos de depressão", diz a bióloga Gisele Lobo, especialista em esponjas. Para manter seu espaço de trabalho, conta que leva lâmpadas e material de limpeza de casa.
"Muita gente tem medo de ficar aqui por falta de segurança", diz a bióloga.

O número de inscritos para o vestibular de 2018 da Uerj, que já teve professores como Joaquim Barbosa (ex-presidente do Supremo Tribunal Federal), caiu de 80.243 em 2016 para 37.393 neste ano.

Quem ingressou em uma universidade estadual do Rio mal teve aula. A Uenf segue em greve. O ano letivo na Uerj só começou mesmo no final de agosto.

Lucas Silva Barbosa, 20, calouro de relações públicas na Uerj, trabalha em uma empresa júnior, a Expresso Consultoria, incubada na universidade. "A empresa júnior deve colocar em prática o que se aprende na sala de aula, mas estou praticando coisas que ainda não aprendi."

"As pessoas falam da Uerj, mas se esquecem que estamos na mesma situação", diz o geógrafo da Uenf Marcos Pedlowski. A universidade fica em Campos dos Goytacazes, a cerca de 300 km da capital fluminense.

Há quem esteja com o laboratório quase parado por falta de recursos. Caso do biólogo Antonio Carlos de Freitas, da Uerj, que pesquisa aquecimento global com colegas estrangeiros -a universidade está entre as dez do país com mais internacionalização na pesquisa.

Em 2015, Freitas perdeu amostras da Antártida e equipamentos por causa de uma enchente que atingiu seu laboratório. Por falta de recursos, não conseguiu repor nada -nem pintar as paredes com marcas da água.
"Agora faço pesquisa teórica. Não vamos parar", diz.

OUTRO LADO

A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Fazenda do Rio afirmou, em nota, que os pagamentos do 13º salário de 2016 e dos próximos vencimentos dos funcionários públicos estão condicionados a uma operação de crédito de R$ 3,5 bilhões garantida pela União.

Trata-se de uma antecipação da venda da Cedae, estatal de saneamento e abastecimento de água do Rio.

A operação será feita por uma instituição financeira por meio de licitação. A nota afirma que o governo "vai agilizar o processo licitatório para que o recurso entre no caixa estadual o quanto antes".

O governo do Rio nega que esteja em discussão um plano de privatização das estaduais fluminenses. Essa possibilidade foi levantada em setembro, quando o Ministério da Fazenda falou em "revisão da oferta de ensino superior" no Rio de Janeiro.

"Nunca discuti privatizar a Uerj, não há espaço para isso", diz o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão.

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