Brasil não mede evasão escolar nem analisa os perfis dos alunos

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"Nem tudo o que pode ser contado conta, e nem tudo que conta pode ser contado."

Frequentemente atribuída a Albert Einstein, a frase do sociólogo William Bruce Cameron em artigo de 1963 pode servir de reflexão na tentativa de entender o desempenho de instituições e do próprio ensino superior.
Fora o que não pode ser contado, enfrentamos ainda hoje no Brasil um desafio: conseguir informações que contam e que são, sim, possíveis de serem analisadas.

O Ranking Universitário Folha, por exemplo, é resultado da organização e da categorização de informações disponíveis sobre as condições do ensino superior brasileiro. Informações relevantes para melhor desenhar esse panorama, entretanto, não estão disponíveis.

Se o objetivo, por exemplo, é entender o perfil dos alunos e medir a inclusão, há lacunas. Os dados do Censo da Educação Superior sobre cor de pele dos estudantes têm até 28,9% de respostas definidas como "aluno não quis declarar cor/raça". O que inviabiliza esse uso.

Adriano Vizoni/Folhapress
RIO DE JANEIRO - RJ - BRASIL, 18-08-2017, 16h00: ESPECIAL RUF 2017. Campus da UERJ, no bairro do Maracana. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, ESPECIAIS) ***EXCLUSIVO FSP***
Alunos no campus do bairro do Maracanã da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro)

Informações não calculadas de forma sistemática nos impedem de saber qual o percentual de alunos que de fato se formaram ou quantos universitários abandonaram o curso. Uma falha que o MEC (Ministério da Educação) promete corrigir.

Na falta de um dado consistente sobre evasão, uma alternativa seria olhar os números de retenção entre o primeiro e o segundo anos, porque indicariam a capacidade de engajamento do curso, uma vez que o abandono é alto no período. Mas essas informações são inconsistentes.

Nos registros oficiais do MEC, mais de cem instituições indicavam que, em 2015, havia 11.590 alunos ingressantes no ano anterior. Mas nos dados de 2014 eles nem sequer apareciam.

Evasão e retenção após o primeiro ano poderiam incrementar um indicador de qualidade e orientar políticas de melhoria tanto de cursos como de instituições. Comparando com os dados disponíveis sobre pesquisa e inovação nas universidades, a graduação vive hoje um apagão de informações.

QUALIDADE

Como é possível, por exemplo, analisar de forma mais objetiva a qualidade da graduação da USP? Líder em pesquisa no Brasil, ela nem sequer participa do Enade (exame feito por alunos na formatura). Mesmo se participasse: como calcular o quanto a instituição agregou ao desempenho do aluno, já que a peneira da seleção garante ingressantes já bem qualificados?

O presidente da Abave (Associação Brasileira de Avaliação Educacional), Joaquim Soares Neto, explica que a pós-graduação desenvolveu um sistema mais organizado de avaliação e acompanhamento, principalmente por causa das políticas de fomento à pesquisa."No mundo da graduação temos que andar muito mais", afirma ele, que é professor da UnB (Universidade de Brasília).

Neto ressalta que a produção de dados educacionais não é ruim no país. A maior lacuna está em um segundo momento, que é o dos cruzamentos e da produção de indicadores mais contextuais.

Um dos problemas é que bases de dados de órgãos diferentes, mesmo de dentro do MEC, não se conversam. A Capes fica com parte dos dados, a Secretaria de Educação Superior do MEC com outra, enquanto o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) é responsável por outro bloco. Ainda há uma secretaria do MEC que cuida de regulação do ensino superior, que detém mais informações.

"Precisamos entender melhor a trajetória do aluno. Temos que ter maiores evidências, saber se uma pós-graduação forte de fato está refletindo na qualidade da graduação", diz. "São perguntas importantes para o país."

Outra dificuldade é acompanhar as chances profissionais dos egressos de cada instituição e curso. Dados de empregabilidade e salário poderiam ser uma indicação mais segura. Seria possível obter essas respostas com o cruzamento de dados do MEC e do Ministério do Trabalho, a partir do CPF do aluno.

"Em parceria, o MEC poderia olhar para os egressos. Tem que ser parceria institucional. Mas é importante criar no Brasil uma cultura de associações de ex-alunos, que ajudam o contato com o egresso", afirma o professor Luiz Claudio Costa, ex-presidente do Inep.

Costa diz que o Brasil ainda tem fraca cultura de autoavaliação dentro das instituições. Segundo ele, a falta deengajamento dos alunos em torno da prova do Enade (que muita gente entrega em branco) tem de ser combatida de forma educativa.

O Inep informou que tem a intenção de ampliar indicadores criados a partir do Censo da Educação Superior. "Como exemplo podemos citar a construção de indicadores sobre a trajetória dos discentes." Não há, entretanto, plano de divulgação de novos dados. Nem haverá cálculo de empregabilidade.

Além de pesquisa e graduação, o país praticamente não acompanha a terceira dimensão da universidade: não há dados sobre extensão, que forma o tripé do modelo universitário no Brasil.

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